23 setembro, 2019

Aproxima-se a data dos vestibulares das universidades. Essa sustentação foi feita em 2010 na audiência pública no Supremo Tribunal Federal sobre o Programa de Ações Afirmativas.Transcorridos aproximadamente 9 anos a situação agrava-se dia a dia na seleção de estudantes concorrem a uma vaga nas universidades públicas.
Sem dúvida alguma o desvirtuamento do espirito das cotas sociais é público e notório e está a exigir que os agentes públicos examinem essa questão com muita seriedade para assegurar aos estudantes brasileiros o acesso ao ensino superior em concursos seletivos sem fraude.
É importante destacar que o teor da sustentação oral continua absolutamente atual merecendo muita atenção e reflexão.
Wanda Siqueira Advogada
Abaixo segue o link da Audiência Pública.https://www.youtube.com/watch?v=lo8tnY-y-30

18 setembro, 2019

É momento de relembrar Marco Túlio Cicero no qual me inspirei em 2017 para escrever algumas reflexões sobre a República de Roma e a República do Brasil e a violência praticada contra os advogados que defendem os injustiçados em todos os tempos.Lamento que o destino de alguns advogados assassinados na defesa de seus clientes em vários recantos de nosso país em tempos modernos tenham o mesmo fim desse grande advogado romano.Ressalto ainda, que a prova dos atos de abuso de poder contra os advogados tem sido publicizada pela OAB e pelas Comissões de Defesa das Prorrogativas da Advocacia.


Reflexões  sobre a República de Roma na época das Catilinárias e a República do  Brasil  na época das Temerárias

   O romance de Taylor Caldwell que trata da vida fascinante de Cícero  no tempo de César e Pompeu no  período da decadência da democracia romana leva o leitor a concluir que tanto na  República de Roma  quanto na República   do Brasil as  causas da decadência dessas duas repúblicas estão relacionadas aos atos de  improbidade e imoralidade  administrativa e de grave afronta à Constituição.
Personagens  como Júlio César, Catilina, Cúrio  e outros (em Roma) e como  Michel Temer. Cabral, Cunha  e outros (no Brasil ) , arruinaram  as conquistas e o legado cultural, ético e econômico deixado pelos antepassados  ao  violarem  direitos fundamentais dos cidadãos para atender  interesses dos poderosos.
O silêncio dos agentes públicos éticos e honestos - por omissão, corporativismo ou receio de represálias - acaba beneficiando políticos aéticos e perversos  que vendem votos no Congresso Nacional para arquivar denúncias contra o Presidente da República.
     O grande romano Marco Túlio Cícero – o pilar de ferro - orador, filósofo e político, conhecido como o maior advogado de sua época, eleito cônsul em 63 a.C enfrentou a conjuração de Catilina, seu rival derrotado, que pretendia tomar a força o poder.
        Cícero manteve correspondência com o historiador Salústio falando dos fatos que assoberbavam o mundo romano, sem imaginar que esses mesmos problemas que o inquietavam (corrupção, traição, falta de ética, sangramento do erário público, assassinatos, violação da Constituição) iriam se repetir no mundo moderno.
        Nas cartas que dirigiu a Júlio César e nos discursos perante o Senado Romano dirigidos contra Lúcio Catilina, deixou transparecer que a Constituição Romana era a sua mais forte devoção terrena.
          A devoção desse romano corajoso e ético remete aos votos de alguns juízes e advogados  e, especialmente,  aos discursos e votos  do Ministro Ayres Brito no STF que  deixou transparecer seu respeito a Constituição Brasileira, dando ênfase  ao artigo 37 que determina que os agentes públicos respeitem os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência - o ministro poeta costuma dizer    que o artigo 37 “é a cereja do bolo da nossa Carta Magna”.
            É de lamentar que poucos pensem assim!
            Os discursos de Cícero no Senado Romano contra o político inescrupuloso Catilina causava  mal estar entre os canalhas e, por essa razão,  deveriam  ser citados  pelos bons políticos no n Congresso Nacional nos discursos  contra  políticos inescrupulosos e pusilânimes  durante as votações de emendas e projetos e, com coragem cívica  nos casos  que envolvem  evasão de divisas, lavagem de dinheiro, corrupção, obstrução da justiça e tráfico de influência, considerando a similitude entre  os atos de  improbidade , denunciados por Cícero no Senado Romano.
          .Mais de dois mil anos separam a República de Roma da República do Brasil ,mesmo assim. políticos corruptos dessas duas repúblicas não mudaram, continuam sangrando os cofres públicos como sempre fizeram nesses dois milênios de história.
    Em “ As Catilinárias”,Cícero  uniu reflexão filosófica à ação pública: (...) “ Ó romanos, visto que já tendes presos e apanhados os chefes ( os cabeças) criminosos ( desta) guerra muito iníqua e muito perigosa, deveis julgar ( pensar) que se malograram ( que caíram) todas as tropas de Catilina, todas as ( suas) esperanças e ( todos os seus) recursos, expulsos esses perigos da cidade. Na verdade, quando ( eu) expulsava este da cidade, providenciava isto no espírito, ó romanos, que, afastado Catilina, nem devia ser temida por mim a temeridade furiosa de Caio Cétego, nem o sono de  Públio Lêntulo, nem a obesidade de Lúcio Cássio.”
    Falta escrever sobre as Temerárias que suprimem direitos, mantém  o trabalho escravo, reduzem verbas do FIES e do PROUNI, oferecem banquetes aos congressistas e nomeiam ministros envolvidos em inquéritos e denúncias.
    Discursos semelhantes aos de Cícero, ao pronunciar as quatro Catilinárias, 63 a.C, fez malograr a conjuração de Catilina, político romano que tramava um golpe de Estado não encontram eco no Congresso Nacional quando raros políticos tentam conter a inescrupulosa venda de votos para aprovar ou rejeitar projetos e até mesmo para arquivar denúncias.
           Cícero, secundando Aristóteles, já dizia que “os países que ignoram a História estão fadados a repetir suas tragédias”. Na República do Brasil estamos fadados a repetir as tragédias gregas e romanas porque os pós-modernos acreditam  que a História acabou com a queda do Muro de Berlim. 
     Nossos governantes, com raríssimas exceções, não dão ênfase à educação humanística porque consideram que dar tempo ao pensamento, para respirar a Antiguidade, seria dar tempo ao ócio. Preferem dar tempo ao negócio!
           O pensamento utilitarista, marca da nossa sociedade, faz com que os agentes públicos da República do Brasil  esqueçam que a Filosofia e a História deveriam estar coladas às vidas ao invés de serem riscadas do currículo de ensino.
    Repugna ao bom senso lembrar que governantes e sociólogos que se preocuparam com a educação brasileira não foram valorizados em seus tempos e hoje há até quem os despreze, especialmente, aqueles que valorizaram a criatividade, a inteligência e a espiritualidade das gerações  de milhões e milhões de mestiços (pardos) que enriquecem nossa cultura. 
    Na República de Roma, Ático chegou a escrever que Cícero não chegaria a ser apreciado enquanto vivesse, mas que: “ gerações ainda por vir hão de ser o receptáculo de tua sabedoria e tudo o que haja dito ou escrito haverá de servir de conselho aos países ainda desconhecidos “.
           Cícero ensinou aos romanos que o poder sem lei é o caos  e  que o Direito não se origina  no homem e sim em Deus e que existe uma força que não nasce das armas, mas do coração e da alma dos homens  decentes. Foi justo em todas as suas ações, protetor dos oprimidos, prudente nas decisões e sedento de justiça.
           Cícero teve como mestre o advogado Cévola, combativo advogado romano, conhecido como o terror dos senadores venais. O velho advogado sentia pelo  discípulo   um amor paternal  e certa vez , depois de um atentado contra Cícero disse-lhe: “ Júlio César é um mentiroso. Manipula a verdade admiravelmente, a fim de que ela sirva a seus propósitos, é capaz de  sobreviver a Sila”  ao que Cícero respondeu:  “Não posso acreditar que Júlio a quem tanto estimo , tenha sido responsável pelo ataque à minha vida “. Cévola disse mais : “ Sempre faça o maior número de amigos  que lhe seja possível . Se você tiver uma enormidade de amigos, é possível que, numa emergência, você possa contar com um – se tanto”.
     Cévola foi assassinado logo após uma defesa feita por Cícero  no  Senado Romano. Naquele dia havia somente  trinta senadores presentes , apenas alguns eram homens íntegros. Os depravados estavam preocupados com a coragem e o idealismo de Cícero na defesa de seu cliente acusado injustamente. Dentre eles encontrava-se o senador Cúrio homem  péssimo e corrupto, amigo intimo dos Catilinas, sempre   pensando se a espada oculta de Cévola não o estaria protegendo.
Cícero foi tomado de enorme pesar com o assassinato de seu mestre. Mas os assassinos jamais foram descobertos. Os senadores, tribunos e cônsules, cinicamente, expressaram seu horror e seu ódio. Poucos compareceram ao enterro.
Na República do Brasil, esse cinismo já não surpreende, muitos  deputados e senadores expressam cinicamente   sentimentos de pêsames quando homens públicos,  com o perfil de Cévola  ou de Cícero  são assassinados e logo esquecem, como em Roma, no Brasil  os assassinos raramente  são identificados .
           Marco Túlio Cícero , vestindo a toga branca e levando uma espada à cinta pronunciou a oração fúnebre: “ Não é Cévola que deve ser vingado. É Roma que deverá ser vingada. Um patriota foi silenciado para sempre; e quando patriotas morrem, as espadas dos homens de bem não podem ser embainhadas enquanto não estejam avermelhadas pelo sangue dos traidores. Diz-se que os assassinos eram três. Mentira, havia uma nação de assassinos. Um povo corrupto e vicioso autorizou essa morte, sua apatia, mesquinhez, covardia e falta de patriotismo. Há muito tempo que ele fora sentenciado à morte. O povo não está isento de culpa. Devemos vingá-lo não o esquecendo nunca, combatendo os tiranos, a fúria e as traição que habitam os corações dos homens maus. Que sua morte não tenha sido em vão.”
    O povo brasileiro não ficará isento de culpa se nas eleições de 2018 elegerem políticos com o mesmo perfil de Catilina e Júlio César eis que têm o direito e o dever de exigir satisfações dos  agentes públicos sobre o o  assalto ao erário  e o enriquecimento ilícito de corruptos e corruptores. Não são os políticos brasileiros que devem ser vingados, é o Brasil que deve ser vingado!
    Cícero certa vez confessou melancolicamente que não tinha o dom de parecer feliz e não conseguia encontrar a paz porque não cedia em coisas contrárias aos seus princípios. Como Cícero, muitos brasileiros confessam sentirem-se infelizes porque não conseguem transigir com princípios.
    Na República do Brasil faltam Cíceros e sobram Catilinas e os problemas semelhantes entre as duas repúblicas estão a exigir que a sociedade brasileira fique alerta porque se na República de Roma houve assassinatos com punhal e envenenamento  na  República do Brasil  há assassinatos  disfarçados de acidentes aéreos, assassinatos com corpos carbonizados em automóveis e violência urbana e no campo.
           Enquanto as  operações da Policia Federal desvendam esquemas de  fraude em precatórios, em licitações (obras publicas e merenda escolar ), em  concursos públicos, corrupção sistêmica , evasão de divisas, enriquecimento ilícito e tráfico de influência o povo mantém-se em doloroso silêncio e as instituições se enfraquecem.
           É triste e até constrangedor afirmar que nesses cento e vinte e oito anos da Proclamação da República do Brasil não temos muito a comemorar.
Felizmente, inspirados em Cícero, temos muito a indagar: ’Quosque tandem abutere, Catilina, patentia nostra?
    (...)” A quinta espécie é a dos patricidas, dos sicários, finalmente de todos os fascinorosos : que eu não separo de Catilina, porque nem podem desligar-se dele; que morram certamente no latrocínio, porque são de tal maneira numerosos , que a prisão  (o cárcere)não pode contê-los”.
           Rogo a Cícero, com quem a Fé (dos judeus) e a Razão (dos gregos) andaram juntas, que nos intua a escrever  ‘‘As Temerárias’’, no mesmo tom  em que  ele escreveu   ‘As Catilinárias’,  para registrar que a  corrupção sistêmica que  avassala e envergonha nosso país perante o mundo deve ser combatida com amor à Constituição.
“ Eu confio que a estes (homens) algo fatal está iminente e que a pena (o castigo) há muito devida à improbidade,à  perversidade, ao crime, à dissolução,  ou ameaçam já abertamente ou por certo se aproximam já”(...) ”Os homens de boa vontade, cônscios da Lei  prescrita por Deus, opor-se-ão aos governantes que dependam exclusivamente do capricho de outros homes e - caso desejem sobreviver como um país – destruirão o governo que tente fazer justiça pela força ou por intermédio de juízes venais .
           Até quando Presidente Temer abusarás da paciência do povo brasileiro?

                                                      * Wanda Siqueira
                                                             advogada
Excelente ! A OAB está cumprindo seu papel institucional na defesa da sociedade e da advocacia!
Link:https://www.poder360.com.br/justica/oab-aprova-posicao-por-derrubada-de-vetos-a-lei-de-abuso-de-autoridade/
Vivemos um momento de tanta afronta à dignidade da pessoa humana que foi impossível silenciar como advogada que atua na defesa de estudantes e da cidadania há mais de 40 anos e que nunca transigiu com princípios que afrontam a Carta Magna e o Estatuto e Código de Ética da Advocacia
Foi com extrema emoção que escrevi o texto que segue porque acredito que a palavra é a única forma de demonstrar nossos sentimentos mais profundos e se calarmos corremos o risco de ficar doentes como nos ensina a Psicanálise nos ensinamentos de Freud  e Lacan , especialmente, quando a memória de um estudante que no período de ditadura teve um destino trágico lutando pelo Estado Democrático de Direito.

DIA DO ADVOGADO, DIA DOS PAIS E DIA DOS ESTUDANTES

Neste 11 de agosto de 2019 desejo prestar uma simples homenagem aos advogados, aos pais e aos estudantes  dirigindo estas palavras, especialmente ao estudante  Fernando Santa Cruz e ao advogado, seu filho, Felipe Santa Cruz, para falar do sentimento de tristeza que me invadiu nos últimos dias, ao ouvir as ofensas dirigidas à memória do estudante perseguido e desaparecido em 1974 durante a ditadura militar, quando militava no Movimento Estudantil Brasileiro, lutando pela democracia e sonhando com um país onde a liberdade de expressão, dentre outros valores caros aos estudantes e ao povo brasileiro, fossem assegurados.
Quis o destino que seu filho, Felipe Santa Cruz, fosse eleito presidente da OAB Nacional 45 anos após a tragédia que enlutou sua família e fez com que sua avó escrevesse muitos apelos às autoridades, para obter resposta sobre o desaparecimento do filho. Ela esperou por notícias até os últimos dias de sua vida, ficando sem resposta mas, felizmente, foi poupada de ouvir as cruéis palavras de injúria dirigidas ao filho amado, porque faleceu poucos dias antes de serem proferidas essas injúrias.
O ilustre colega, que preside hoje a OAB, perdeu o pai aos dois anos de idade e conviveu com a dor e o luto dessa tragédia, sem ter o direito de receber seu amor.
 É triste reviver essa dor e, mais triste ainda, é ter de ouvir e suportar as palavras cruéis e injustas dirigidas à memória de seu pai, com a deliberada intenção de calar a sua voz na presidênca da OAB, onde tem a responsabilidade de honrar o compromisso assumido, de lutar pela defesa do Estado Democrático de Direito, de acordo com os princípios da Constituição  Federal e do Estatuto e Código de Ética da Advocacia e, assim, honrar e dignificar a instituição que dirige com tamanha dedicação.
Não consigo silenciar diante de uma injustiça dessa natureza!
Há dias quero falar aos advogados e estudantes sobre esse  sentimento de indignação que sinto pelas injúrias e palavras cruéis ofensivas à dignidade de nosso líder que atinge, também, a advocacia que não pode calar neste momento.
Não há dúvida que as ofensas à memória de seu pai têm como objetivo  reviver o passado sem consertar ou se escusar pelos atos cruéis praticados durante a ditadura  e, assim, tentar amedrontar e calar os estudantes para que não defendam a democracia, sob pena de sofrerem, também, represálias.
Tempos difíceis e de desencanto vivem os brasileiros e os advogados guardiões e defensores dos que desejam que os princípios da nossa Carta Magna sejam rigorosamente observados.
Neste momento, a advocacia brasileira e os que sonham com a construção de um país democrático e com justiça social, não podem silenciar e, muito menos, se acovardar.
Dirijo-me também aos estudantes, com a certeza de que estarão unidos para dar continuidade ao sonho dos estudantes vivido no período da ditadura e se inspirem nos mesmos ideais de liberdade e democracia de Fernando Santa Cruz, para que nunca mais os torturados, desaparecidos e mortos durante a ditadura tenham sua memória e honra aviltadas.
Com esse mesmo sentimento de amor à verdade e à Justiça, conclamo aos colegas advogados que se mantenham unidos na defesa de valores tão caros a todos.
É preciso ter a coragem do maior orador e advogado romano, Marco Túlio Cícero, que não se curvou diante dos tiranos e nos legou as Catilinárias que, certamente lhe custaram a vida, mas o eternizaram pela coragem. Sigamos seu exemplo nestes tempos em que os mesmos erros do Império Romano nos ameaçam e assombram!
Caro presidente Felipe Santa Cruz, a advocacia brasileira lutará contigo nesta causa justa. Fomos, desde a antiguidade, os defensores dos injustiçados e sempre seremos um exército de fortes na defesa do Direito e da Justiça.
Tenho a intuição de que o pai de nosso presidente o protege e fortalece dizendo ao seu ouvido as palavras do grande advogado Sobral Pinto “A advocacia não é profissão para covardes“ e foi esse sentimento que transpareceu na fala de Felipe Santa Cruz na entrevista no Programa Roda Viva, que me fez depreender que, mesmo sendo vítima de uma injustiça, tem o consolo de saber que pior do que ser injustiçado é ser vingativo.
O meu consolo é acreditar que nossa classe se indigna contra injustiças e que é essa força que nos une e move para continuar trabalhando arduamente na defesa da causa dos injustiçados, combatendo com dignidade e coragem atos de abuso de poder, ainda que  insatisfeitos com a insegurança jurídica, atualmente da ordem do indizível.
É como penso !
*Wanda Siqueira

03 janeiro, 2017

Cancelamento de matrícula na UFPel: abuso dos agentes públicos da universidade viola o sagrado direito de defesa

Wanda Gomes Siqueira
Advogada
                                                                  
Os agentes públicos das universidades brasileiras e, neste caso, da UFPel, costumeiramente praticam atos de abuso de poder contra os estudantes a partir de denúncias de movimentos que não representam o sentimento da maioria do povo brasileiro porque incentivam o ódio entre brancos, pardos e índios, esquecendo que a maior riqueza cultural é justamente a miscigenação espontânea presente de norte a sul do país independente de cor ou credo.

A universidade anuncia que está criando um grupo de trabalho para a averiguação da veracidade da autodeclaração de estudantes que ingressaram entre os primeiros semestres de 2013 e 2016 sob o argumento de que, antes, a autodeclaração não era contestada e que, basicamente, os processos eram instaurados a partir de denúncias.

Cabe indagar: esse grupo de trabalho a que se refere a universidade é um Tribunal Racial? Se for um Tribunal Racial com esse objetivo, a universidade está cometendo grave e perigoso precedente que afronta princípios constitucionais.

É notório que em nosso país os cidadãos que se autodeclaram pardos estão sofrendo discriminações da ordem do indizível, ao ponto de terem suas imagens divulgadas nas redes sociais com o estigma de fraudadores de processos seletivos para ingresso nas universidades e em cargos públicos.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) configurou um dos cinco grupos de "cor ou raça" que compõem a população brasileira, junto com brancos, pretos, amarelos e indígenas. 

A Lei nº 12.990/2014 e a Resolução nº 203/2015 do Conselho Nacional de Justiça estabelecem que poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclarem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pelo IBGE.

Sem dúvida alguma, a tese que venho sustentando desde 2008, inclusive quando participei como amicus curiae no Supremo Tribunal Federal sobre o desvirtuamento do espírito do Programa de Ações Afirmativas - reserva de cotas sociais no âmbito das universidades públicas confirma-se com o desligamento dos alunos da UFPel. (https://www.youtube.com/watch?v=lo8tnY-y-30) e (https://www.youtube.com/watch?v=xrtR6xwpaMM)

Defendo a tese que o ingresso através de reserva de vagas nas universidades públicas deve ser feito para a inclusão dos estudantes pobres, sejam eles pretos, pardos ou índios. Esse é o verdadeiro sentido da referida lei. 

Causa perplexidade o fato de serem investigados, perseguidos e discriminados estudantes que se autodeclaram pardos e não serem investigados estudantes que frequentam escolas públicas de excelência, a exemplo dos Colégios Militares e dos Colégios de Aplicação das universidades públicas que, via de regra, são de famílias de origem rica e frequentam os melhores cursos pré-vestibulares. Supõe-se que a universidade pública não quer estudantes pobres! O Tribunal Racial a que me refiro deveria ser substituído por uma comissão que investigue se o estudante beneficiado pelas cotas sociais é pobre e necessita dessa reserva de vaga nas universidades.

É fácil concluir que a universidade não está sabendo interpretar o espírito da Lei das Cotas Sociais ao permitir que ricos ocupem as vagas dos pobres e, consequentemente, cancelar a matrícula de estudantes pardos, supostamente pobres, com base em denúncias e fotografias que estampam os rostos de pessoas que se reconhecem como pardos, ou seja, brasileiros com variadas ascendências étnicas, com misturas de cores de pele, seja miscigenação mulata (descendentes de brancos e negros), cabocla (descendentes de brancos e ameríndios), cafuza (descendentes de negros e indígenas) ou mestiça.

O desligamento de alunos que se autodeclararam pardos é um ato atentatório à dignidade da pessoa humana e fere a legislação vigente porque se nos editais dos concursos vestibulares há previsão de reserva de vagas para pretos, pardos e índios, há que aceitar como verdadeira a autodeclaração dos estudantes pardos considerando que 84 milhões de brasileiros se autodeclaram pardos, conforme identificou o IBGE na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios em 2006. A universidade quer criminalizar os estudantes e judicializar essa questão com a deliberada intenção de destinar as vagas das matrículas canceladas para estudantes que não necessitam dessa reserva e, ao proceder assim, colocam-se os agentes públicos no campo da ilegalidade e abuso/desvio de poder.

Resta concluir que, enquanto a lei estabelecer essa reserva, os brasileiros que se autodeclaram pardos não devem ser discriminados, mesmo que a cor da pele seja clara, sob pena de incentivar movimentos sociais que não representam o sentimento do povo brasileiro. Será que a universidade brasileira esqueceu as lições de Darcy Ribeiro? Estudos genéticos revelam que pardos possuem ancestralidades européias, indígenas e africanas, variando as proporções de acordo com o indivíduo e a região.

Cabe aos agentes públicos das universidades ensinar os educandos a conviver e respeitar as diversidades, sejam étnicas ou de gênero, sob pena de se permitirem o ódio entre seres humanos ao ponto de dar ouvidos a denúncias baseadas em fotografias de rostos de pessoas com pele clara. 

O desligamento dos alunos da UFPel gera sentimento de revolta entre as pessoas de bom senso que reconhecem o desvirtuamento do espírito do Programa de Ações Afirmativas .

O princípio do in dubio pro alumnus há de ser respeitado no MPF e no Poder Judiciário para evitar que se consumem injustiças com o desligamento dos estudantes pardos, lembrando lições do saudoso professor e sociólogo Darcy Ribeiro sobre a identidade étnico-nacional, a de brasileiros:
Nós, brasileiros, somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos viveu por séculos sem consciência de si... Assim foi até se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros...”
– A lei Lei nº 12.990/2014:
Art. 2o Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
– Resolução n. 203/2015 do Conselho Nacional de Justiça.
Art. 5º Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos, no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).